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R. A CERTEZA de que o trabalho,
passado o estágio mental/reflexivo não depende
mais do processo físico/criativo, e é dado como terminado
no tocante à minha participação………………………..
Artur Barrio
[Rio de Janeiro, 21 de Setembro de 2008]
Os pensamentos que seguem são trechos extraídos de uma troca espontânea e calorosa de e-mails, ocorrida em setembro de 2008.
CLARISSA DINIZ. Essa sua posição de “lavar as mãos” diante da interpretação/recepção de seus trabalhos faz ver uma concepção de ‘coerência’ que, em última instância, seria domínio do olhar alheio, e não nosso.
ARTUR BARRIO. Pitagoricamente, diria que o espectador faz a obra, já que o centro é determinante e suscetível à crítica do entorno ao contrário do não situar-se desse ou desses mesmos espectadores em relação às “Situações”. Daí o surgimento de que “o espectador não faz a obra”.
CLARISSA. Tem uma idéia de que gosto muito, e que diz que “é preciso ser dependente para ser autônomo” (Edgar Morin). É uma concepção de grande complexidade, e faz com que fujamos do duopólio obra-espectador que normalmente ainda nos guia. Você, a meu ver, faz isso em seu comentário anterior ao analisar simultaneamente o espectador como capaz e incapaz de fazer a obra.
BARRIO. A minha relação é com a Arte, com o momento da criação e conseqüente ruptura dos limites inerentes a esse momento,…….no que toca à questão espectador/entorno é algo que não me interessa, o que não quer dizer que já não tenha sido do meu interesse em situações anteriores.
Quanto a Edgar Morin, de que “é preciso ser dependente para ser autônomo”, estou de acordo, mas dentro de um estágio de tempo limitado aos processos iniciais, diria que em nossa condição isso é extremamente evidente sendo que essa autonomia encontra a sua maior força no gesto artístico que por si só é político, mas não determinante ou determinador de uma Arte política, mas simplesmente Arte, que por si só é política/etc., ou está a ser ou já foi criado, um novo “ismo”? Um modelo/forma de fazer Arte política? Uma “outra arte acadêmica”? A verdadeira Arte sempre foi política; ou o “homem” não é um animal político?
CLARISSA. Me intriga ouvir de tantos que sua arte agora são suas viagens, seus mergulhos. É?
BARRIO. Sim a humanidade inventou tudo, inclusive a política. Não pensei na humanidade, mas somente numa ínfima partícula que é o artista que sou e produziu o que produziu,………!
Quanto à humanidade, apesar de acreditar profundamente no ser humano, penso que o número dos mesmos não pára de aumentar nesse delírio/carnal/explosivo/demográfico……
……….somos nove bilhões. Os problemas de base dessa mesma humanidade continuam a ser sempre os mesmos….
….,há progressos, sim, mas quantos retrocessos!
É difícil sair da caverna, a luz elétrica foi inventada há tão pouco tempo, a metralhadora primeiro que a máquina de escrever, etc. Além do efeito-elástico em relação à Idade Média.
Não sou otimista.
A minha arte, hoje, não é os mergulhos submarinos ou a navegação, continuo isso sim os associando, em alguns poucos casos, ao meu trabalho. A minha idéia era e ainda é que a partir dessas experiências possa tirar algo que acrescente e dê outro rumo ao meu trabalho, o que espero que aconteça.
Em 15 de Maio de 2009 inaugurarei uma mostra na parte subterrânea do M.A.C. de
Serralves/Porto/Portugal,…………….intitulada ADEUS PORTUGAL.
…..gostaria de apresentar um trabalho que tivesse uma relação forte com essa fusão de experiências e não registros disso ou daquilo,…tenho algumas idéias, tentarei e caso não o consiga, o trabalho voltará a ser o que sempre foi nestes últimos anos o que para mim transformou-se em algo imbuído de uma
certa monotonia devido ao uso dos mesmos materiais, abrir buracos/escarificações nas paredes, etc. /Veremos.
CLARISSA. Gosto de ver sua idéia de que a repetição de procedimento criativo deixa a produção monótona. É essa uma das discussões que estamos levantando na revista Tatuí sobre coerência. Interessa-nos muito pensar como é que os artistas lidam com a repetição (que pode ser vista por uma perspectiva essencialista) e com o método na arte. Identificamos muita produção que se assemelha a um passo-a-passo extremamente metódico e metodológico e, diante de uma concepção mais visceral/catártica/expressiva da arte, tais concepções são um grande ruído. É isso que nos atrai na discussão….