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Buscando perceber de fato o trabalho de Carlos Mélo, me dei conta que minha busca percorria o caminho do óbvio, e que eu insistentemente me detinha a buscar o complexo. Ora, eu queria complicar o que de fato se apresentava de forma, talvez, bem simples.
É simples, por exemplo, perceber que em cada trabalho de Carlos existe um ritual particular e performático, uma atitude intimista do artista com suas próprias tradições e relacionamentos com o outro e com o mundo, que por várias vezes ao apresentá-las, consegue torná-las minhas, suas, nossas. Em seus desenhos, objetos, fotos, ações… é possível perceber a presença (ou mesmo a ausência-presença) do corpo. Carlos usa o corpo, o seu ou o de terceiros, coloca-os no espaço como matéria territorializante, concedendo-os características específicas sobre sua localização. Corpo e espaço se fundem deixando-se perceber um fluxo de relações entre estes e os que os observam.
Em suas últimas performances, ao invés do próprio artista, o corpo presente é o de atores contratados para realizar as ações em espaços previamente demarcados. Não me parece mais pertinente a discussão sobre a verdadeira autoria da ação – acho que Yves Klein já elucidou essa pergunta – ou se continua sendo performance porque há atores “interpretando”. Apesar desse tipo de trabalho tornar a linha que separa performance e teatro ainda mais tênue, devemos lembrar que na encenação há criação de personagens, enquanto que na performance há um sujeito que apresenta a si mesmo – uma auto-referência. No trabalho de Carlos há um motivo para o uso de atores, o que eles têm a seu favor é a não timidez em ficar diante do público, é sua técnica vocal e imposição corporal, e se nem eu, nem você, nem o artista as possuímos, que usemos profissionais. Afinal, se reclamamos quando vemos qualquer coisa mal feita, por que não iríamos reclamar de uma performance mal “interpretada”?
Parece-me simples perceber no trabalho de Carlos um tripé que lhe sustenta: corpo, religião e política; todos estes dependentes do espaço, que na verdade é um quadrado amoroso onde todos estão cientes da presença do outro. Talvez seja essa “orgia” entre os temas que torne o trabalho de Carlos de início confuso. É que ao menos pra mim (não sei se pra você também), essa relação parece ir de encontro com nossos princípios viciados.